Alameda da Universidade, Lisboa

A presença do Grupo Wagner em África e a relação UE-África

07-04-2023

Parte Introdutória

A operacionalidade militar da Federação Russa em solo ucraniano a partir de fevereiro de 2022, não representa uma novidade e é uma tragedia que detém especial interesse para o Ocidente. Com o desenrolar do conflito, tornou-se comum verificar nos noticiários algumas notícias sobre as forças militares russas, entre as quais o célebre Grupo Wagner. Mas, o que é o Grupo Wagner?

Segundo o Presidente francês, Emmanuel Macron, «trata-se de um grupo de mercenários criminosos». [1] No entanto, as opiniões divergem entre os representantes dos diversos Estados reconhecidos pelas Nações Unidas.

O que é o Grupo Wagner?

O Grupo Wagner é uma empresa militar privada que foi fundada na Rússia há cerca de 9 anos atrás por Yevgeny Prigozhin [2]. Consta-se que, cerca de 80% dos seus membros foram recrutados em prisões. O seu centro de treino localiza-se perto da base do GRU (serviço de inteligência militar russo).

Além disso, os membros das milícias Wagner são conhecidos por defenderem ideologias e organizações de extrema-direita. Destaca-se também que estão acusados da prática de vários crimes de guerra, nomeadamente tortura, violação, entre outros.

Atualmente, o Grupo Wagner desempenha atividades na Ucrânia, Síria, Líbia, Moçambique, República Centro-Africana, Mali, Sudão, Níger, Madagáscar, Burkina Faso, etc. É possível concluir que as suas forças militares estão presentes em diversos países africanos. Por isso, é necessário perceber quais são os seus interesses no continente africano e determinar o nível de influência da Rússia nos respetivos países.

África

Nos últimos anos, Prigozhin tem organizado expedições militares em África a fim de proteger as empresas russas com ligações ao Kremlin, que exploram os negócios inerentes à mineração de pedras preciosas.

Contudo, o Grupo Wagner possui uma presença bastante significativa nos países localizados na região do Sahel. [3] A meu ver, esta situação comprova que a Federação Russa tem vindo a adquirir preponderância neste continente, porque o seu governo está a fortalecer as suas relações diplomáticas com estes Estados africanos. As razões mais evidentes que explicam esta questão são as seguintes:

  1. A deterioração das relações entre a França e os EUA com os Estados do Sahel.
  2. O passado colonial europeu.
  3. O terrorismo islâmico.
Imagem 1. Mapa dos gasodutos
Imagem 1. Mapa dos gasodutos

Em primeiro lugar, as relações externas da França com as suas antigas colónias estão cada vez mais débeis. Por exemplo, o governo do Mali decidiu expulsar o embaixador francês do seu território, há poucas semanas atrás.

Relativamente aos EUA, as relações deste país pioraram com o Mali e Burkina Faso, a partir do momento em que o Presidente Joe Biden suspendeu o acesso ao comércio livre dos dois Estados ao mercado norte-americano. [4]

Segundo, há cada vez mais países africanos que preferem desenvolver relações de parceria com a Rússia, devido ao seu auxílio prestado às antigas colónias durante a fase de descolonização pela antiga URSS, que ocorreu após a II Guerra Mundial.

Terceiro, os Estados do Sahel enfrentam perturbações graves relativamente à sua segurança. A proliferação crescente de terroristas islâmicos originou a queda de vários governos, o agravamento de crises humanitárias e a existência de ameaças à integridade territorial dos Estados referidos estão a causar uma instabilidade sociopolítica elevada. Porém, a França tomou algumas medidas que não beneficiaram os habitantes do Sahel, como o fim da operação antiterrorista Barkhane.[5] Portanto, este fator contribui ainda mais para o sentimento anti-França, que está a crescer nesta região africana.

Por outro lado, o Grupo Wagner forneceu não só equipamento militar, como também militares para auxiliar os Executivos do Burkina Faso, República Centro-Africana, Mali, entre outros países, na defesa contra as ofensivas terroristas.

A relação UE-África

No dia 29 de março, o NESTEU[6] organizou uma Mesa Aberta Presencial sobre o tema «A Relação da Europa e a África na dimensão securitária» com o Observatório do Mundo Islâmico.

Durante esta sessão foram abordados vários temas. Relativamente à segurança, salienta-se que a UE está a fracassar na sua tarefa de auxiliar os países africanos no combate quer ao fundamentalismo islâmico, quer aos grupos beligerantes responsáveis pelos sucessivos conflitos armados no Sahel.

O domínio da energia também foi mencionado pelos oradores do painel. Neste contexto, discutiu-se o potencial energético da região do Maghreb. Nesta região, localizam-se os gasodutos que abastecem os países da Europa Mediterrânica e do Sul, a saber:

  1. Medgaz: Argélia-Espanha.
  2. Galsi: Argélia-Itália. fig.1 - Mapa dos gasodutos
  3. Trans-Mediterrâneo: Argélia-Itália.
  4. Greenstream: Líbia-Itália.

Na minha perspetiva, a UE deve possuir uma relação cooperativa com os países do Maghreb em matéria energética dado que os seus Estados-Membros dependem diretamente do gás natural oriundo de África, nomeadamente aqueles que se localizam perto do Mar Mediterrâneo.

O governo argelino decidiu encerrar o gasoduto Maghreb-Europa em 2021, que ligava a Argélia ao território espanhol via Marrocos. Esta decisão foi tomada devido à crise diplomática entre os governantes argelinos e marroquinos.

Consequentemente, Portugal e Espanha gastaram mais dinheiro nas importações de gás natural liquefeito, porque as taxas de embarque dos navios são mais caras. [7]

Assim, este exemplo demonstra que uma relação UE-África fortificada proporciona vantagens para os países europeus. Por outro lado, uma parceria cooperativa entre a UE e África pode auxiliar a Comissão Europeia a cumprir com facilidade os seus compromissos com a União Africana, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, Comunidade de Desenvolvimento da África Austral e a Comunidade da África Austral no âmbito do Acordo de Cotonou. [8]

Conclusão

Em modo de conclusão, o Grupo Wagner possui uma excelente organização no continente africano. Esta empresa militar tem auxiliado o governo russo nos últimos anos, no sentido de expandir a sua influência nas Relações Internacionais.

A União Europeia necessita de retomar o diálogo com os países do Sahel, caso queira afastar a presença da Rússia nesta região. Por isso, a Comissão Europeia deve criar um plano concreto para a área da defesa e da segurança internacional, visto que a UE não possui uma estratégia coesa neste domínio.

O exemplo apresentado em relação aos Estados localizados no Maghreb, comprova que os litígios mundiais comprometem o fornecimento energético dos países europeus.


[1] https://pt.euronews.com/2023/03/04/o-que-e-afinal-o-grupo-wagner , acedido a quatro de abril de 2023 

[2] Oligarca e empresário russo.

[3] A região do Sahel estende-se do Senegal até ao Mar Vermelho.

[4] https://carnegieendowment.org/2023/02/28/russia-s-growing-footprint-in-africa-s-sahel-region-pub-89135 , acedido a quatro de abril de 2023 

[5] https://edition.cnn.com/2021/06/10/europe/france-sahel-operation-barkhane-end-intl/index.html , acedido a quatro de abril de 2023 

[6] Núcleo de Estudantes de Estudantes de Estudos Europeus.

[7] https://www.dn.pt/dinheiro/argelia-fecha-hoje-gasoduto-do-magrebe-que-serve-espanha-e-portugal-14275141.html , acedido a cinco de abril de 2023 

[8] O Acordo de Cotonu é o quadro geral para as relações da UE com os países de África, das Caraíbas e do Pacífico.


Pedro Moreira, Estudos Europeus, FLUL


Núcleo de Estudos Europeus da Universidade de Lisboa
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