Partido Livre – Uma alternativa, à esquerda
A democracia portuguesa tem passado por um período atribulado devido aos acontecimentos do ano passado, que culminam com a demissão de António Costa. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, decide convocar eleições antecipadas para dia 10 de março. É, portanto, a nona dissolução da Assembleia da República da história da democracia portuguesa que celebrará os seus 50 anos a 25 de Abril deste ano.
Entre os partidos candidatos à Assembleia da República encontra-se o Livre, um partido relativamente recente, legalizado pelo Tribunal Constitucional a 19 de Março de 2014. Assume-se como um partido profundamente europeísta, defensor de “Uma Europa apoiada na solidariedade e na coesão dos países que a formam” e que “ambicione um alto nível de desenvolvimento económico, social e ambiental.” (Manifesto para uma esquerda livre, 2012) palavras que se encontram repetidamente ao longo de todo o programa do partido e de toda a sua comunicação.
O Livre surge na sequência da publicação do “Manifesto para uma esquerda livre” em 2012 que denuncia a falta de um partido de esquerda verde europeia em Portugal que seja, portanto, europeísta, ecologista e defenda simultaneamente a existência de um estado social, um estado relativamente interventivo na economia para corrigir as falhas de mercado e que seja defensor da saúde e educação públicas. Representam uma esquerda moderada e progressista, “aberta ao diálogo” sem perder a sua essência de esquerda, ou seja, assumem-se como socialistas, mas não negam a existência de uma economia mista com três setores “público, privado e associativo/cooperativo”.
Na sua declaração de princípios destacam a igualdade; a liberdade; o universalismo; a solidariedade; a ecologia; e o europeísmo em linha com o partido verde europeu.
O Livre traz para as eleições legislativas de 2024 um programa a que chamou de “Contrato com o futuro” com propostas fora da caixa e inovadoras, como a semana de quatro dias; o compromisso em atingir os 10% de habitação pública - à semelhança de outros países europeus com maior oferta de habitação pública que Portugal - e atingir os 1150 euros de salário mínimo até 2028.
Trazem, portanto, um projeto ambicioso que não fica por aqui, o programa é completo, transversal e diverso, e apresenta propostas também para educação, fiscalidade e saúde.
No setor educativo o Livre tem propostas para todos os níveis de ensino; propõe valorizar a carreira docente, reduzindo a disparidade salarial entre os docentes e facilitando a entrada dos profissionais para os quadros aos 3 anos de serviço. À semelhança dos outros partidos de esquerda, pretendem eliminar as propinas para as licenciaturas, mas vão mais além e pretendem também eliminá-las no primeiro ano dos mestrados. Destaca-se também a proposta de criar creches públicas o que poderá ser um incentivo à natalidade numa altura em que a pirâmide etária em Portugal está cada vez mais invertida.
Para a saúde destaca-se a aposta no SNS como principal prestador de cuidados de saúde, que poderá coexistir com os restantes prestadores, mas sem descurar a existência de um setor que seja universal e público, que sirva toda a população independentemente da sua situação financeira. Pretendem também reter profissionais no SNS através da melhoria das suas condições laborais e salariais numa perspetiva de igualdade não só de género mas de funções.
Em matéria de fiscalidade pretendem simplificar o sistema fiscal com uma revisão das taxas e escalões de IRS e a atualização do valor de referência para o mínimo de existência. O IRC também deverá ser alterado com a criação de uma sobretaxa progressiva sobre o lucro de empresas nos setores da banca, imobiliário, energia, seguros, distribuição alimentar e armamento.
A política externa é um dos fatores que mais distingue o Livre da restante oferta partidária à esquerda por ser, por exemplo, favorável à NATO, o partido não defende a saída de Portugal da NATO nem a sua extinção, como o PCP, mas concebe-a como uma aliança necessária para o garante da paz e sem carácter belicista, que era o seu projeto original. Consideram a invasão da Ucrânia por parte da Rússia “ilegítima e ilegal”, que Portugal deverá tomar uma posição clara de apoio à Ucrânia e apoiam a desescalada do conflito de uma perspetiva humanitária.
Na Palestina defendem categoricamente a existência do estado palestiniano e a investigação de todos os crimes de guerra e de genocídio, o que deverá ser realizado pelo Tribunal Internacional.
Nas últimas eleições o Livre obteve cerca de 70000 votos, o que lhes permitiu eleger 1 deputado, mas nas últimas sondagens tem vindo a crescer, portanto, ao que tudo indica, poderá eleger mais do que um deputado no dia 10 de Março.
Devido ao seu crescimento recente, coloca-se a possibilidade de o partido poder ser chamado a formar governo em coligação com outros partidos, caso a esquerda obtenha uma maioria. Rui Tavares foi chamado a clarificar a sua posição sobre as soluções governativas que potencialmente viabilizará e o que quis dizer com abertura ao diálogo, ao que respondeu “o Livre, se houver uma maioria à esquerda, é parte da solução, se houver uma maioria à direita, é parte da oposição”, descartando a possibilidade de integrar soluções governativas à direita e mantendo a porta aberta aos restantes partidos da esquerda.
Por fim, o Livre é uma alternativa para quem gostaria de votar à esquerda, mas não se revê nos valores dos restantes partidos, nem na dicotomia PS/PSD a que se tem assistido ao longo de toda história da democracia portuguesa, o voto para os eleitores que acreditam num projeto democrático, igualitário e justo, para a melhoria da qualidade de vida em Portugal e a sua transição para uma sociedade do conhecimento com índices de desenvolvimento humano elevados.
João Lopes